O agronegócio é o pensamento
estratégico nacional. Um dos poucos ou talvez o único. O potencial brasileiro
não se encontra apenas na produção agrícola, mas também na exploração de nossa
biodiversidade. Sendo um país continental, abrigamos diversos biomas com um
grande potência para alimentar a economia do futuro: a bioeconomia.
O termo, que
apesar de existir há mais de 50 anos, ganhou projeção na última década, tendo
sido incorporado, como prioritário, nas estratégias de países desenvolvidos,
como Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Suécia, Finlândia e
União Europeia.
No Brasil, a
bioeconomia tem estado presente no debate também há algum tempo. Foi objeto de cenarização
na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em 2016,
durante a construção dos Cenários exploratórios para o desenvolvimento
tecnológico da agricultura brasileira, que apontavam sua importância. No
cenário “Na crista da onda”, a bioeconomia associada ao protagonismo na geração
de tecnologias de vanguarda e grandes possibilidades de inovação são forças que
geram profunda mudança estrutural em pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I)
nas cadeias agropecuárias até 2034. O país se torna protagonista na geração de
produtos, tecnologias e serviços na fronteira do conhecimento e na sua
implementação nas dimensões alimentícias e não alimentícias, com profunda
diversificação da produção e das oportunidades para diferenciação dos produtos.
Também apresenta resultados significativos na adição de valor ao longo dos
diferentes elos das cadeias produtivas associadas, em particular biofármacos,
bioinsumos e bioprodutos (Martha et al., 2016).
O tema retorna
ao debate nas oficinas e na construção dos cenários para Brasil 2035, momento
em que foram desenvolvidas cenas para bioeconomia em cada um dos quatro
cenários construídos (Marcial, et al., 2017).
Em 2018, o Ministério
da Ciência, Inovação, Tecnologia e comunicação (MCITC), lançou o Plano de
Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação em Bioeconomia cujo objetivo é
“promover o desenvolvimento científico, tecnológico e da inovação para superar
os desafios e aproveitar as oportunidades apresentadas pela bioeconomia
nacional, focando no desenvolvimento sustentável e na produção de benefícios
sociais, econômicos e ambientais”. Em julho de 2019, o Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), publicou a portaria que institui
o Programa Bioeconomia Brasil.
O tema também
foi foco do VII Congresso da Rede Brasileira de Tecnologia e Inovação de Biodiesel,
no início de novembro/2019, em Florianópolis. Ao tempo em que comemoravam o
aumento da mistura do biodiesel ao diesel, levantavam a preocupação com o
contigenciamento dos recursos destinados a pesquisa na área desde 2013, bem
como a necessidade de desburocratização para ampliação do número de start
ups na área. Sem recursos para pesquisa e sem a redução da burocracia a
área teria dificuldade de evoluir.
Entretanto, essas
iniciativa não caracterizam uma estratégia nacional para a bioeconomia, que
alinhe as estratégias dos diversos agentes para transformar o país em um
expoente na área. O economista polonês Christian Patermann, em reportagem
publicada recentemente na revista Exame,
sob o título “Um mundo mais verde,” alerta que “o Brasil deveria ter uma
estratégia nacional de bioeconomia”. Nessa mesma reportagem o coordenador-geral
de bioeconomia do MCTIC, afirma que “sofremos problemas sérios de governança”,
ou seja, falta uma estratégia conjunta que alinhe e otimize os investimentos e
iniciativas existentes no país. Há necessidade de alinhamento estratégico, que oriente,
com visão estratégia de longo prazo, as decisões dos diversos agentes públicos e
privados.
Esse é um
exemplo, dentre outros, nos quais Brasil possui um grande potencial de
desenvolvimento, mas que muitas vezes perde o “bonde da história” pela falta de
uma estratégia de longo prazo que alinhe os investimentos e iniciativas no país.
A questão que
se levanta é: por quanto tempo o país irá permanecer sem uma estratégia de
longo prazo? E, que áreas serão priorizadas? Desde que a antiga Secretária de
Planejamento da Presidência da Repúbica foi extinta que o país padece sem um
rumo de longo prazo. Preso a estratégias de curto prazo dos governo que entram
e saem, repleto de solução de continuidade em projetos estratégicos, vivendo em
voos de galinha.
O Brasil possui
muito mais condições de desenvolve-se e ser líder em bioeconomia do que
qualquer um dos países citados: é um país tropical, com mais de uma safra ao
ano, possui água em abundancia e grandes extensões de terra cultiváveis para
suprir de matéria prima essa economia do futuro, além de uma biodiversidade
fantástica de despertar inveja e cobiça em qualquer país no mundo. Mas precizamos
(precisamos) mais do que isso, é necessário formular uma estratégia, realizar
escolhas e investir em capacitação e PD&I. Precisamos priorizar! Concentrar
esforços! E para tanto, é necessário olhar para as nossa competências essências
e para o futuro.
A bioeconomia poderia
dar mote a priorização dessas áreas estratégicas, pois dialoga com o nosso
pensamento estratégico, com nossa competência essencial e com o futuro, mais
limpo e sustentável. Também poderá gerar muitos postos de trabalho.
O campo da
bioeconomia é enorme, e se amplia quando associado a bio e a nanotecnologia, ofertando
novos materiais limpos, recicláveis e renováveis. Além disso, o país dispõem da
Embrapa, que poderá ser utilizada como peça estratégica chave em todo esse
processo, pois já possui, inclusive, pesquisas nessa área. Falta a definição de
prioridades para a concentração de investimento. Falta uma estratégia e vontade
política.
Definir que
áreas da bioeconomia deverão ser priorizadas é o trabalho que a formulação de
uma estratégia de longo prazo teria a responsabilidade de indicar, para que se
priorize os investimentos em PD&I, capacitação e dos agentes econômicos que
colocarão o Brasil na posição de país desenvolvido que há muito merece ocupar.
Elaine Marcial
é Doutora em Ciência da informação e coordenadora do NEP-Mackenzie – Núcleo de
Estudos Prospectivos da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília.
REFERÊNCIAS
BRASIL.
Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação. Plano de Ação em
Ciência, Tecnologia e Inovação em Bioeconomia. Brasília, DF: Centro de Gestão e
Estudos Estratégicos, 2018.
MARTHA JUNIOR,
G. B.; PENA JUNIOR, M. A. G.; MARCIAL, E. C.; CASTANHEIRA NETO, F.; TORRES, L. A.; NOGUEIRA,
V. G. de C.; CHERVENSKI, V. M. B.; SILVA, G. T. S. da; WOSGRAU, A. C. Cenários exploratórios
para o desenvolvimento tecnológico da agricultura brasileira: síntese. Braília:
Embrapa, 2016. Disponível em: <https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/156492/1/AGROPENSA-cenarios-exploratorios.pdf>. Acesso
em: 14 de nov. 2019.