Por Elaine Marcial
É muito comum perceber uma certa
confusão entre as palavras: foresight, prospectiva e cenários. Cheguei
por um certo tempo a considerar que “prospectiva seria uma tradução da palavra
inglesa “foresight” para a nossa língua, pois as definições são muito
parecidas. Entretanto, após alguns anos de estudos e busca pela compreensão
desses termos cheguei à conclusão que se tratam de conceitos diferentes, apesar
de muito próximos.
Mas por que devemos nos preocupar
com o entendimento e uso dos conceitos de cada palavra? Simplesmente para
podermos utilizá-las de forma correta, seja na fala ou na escrita. Se todos
tivermos a mesma compreensão do significado de um termo, há uma redução
significativa do ruido no processo de comunicação e haverá também grande
redução de mal-entendidos. A conversa certamente fluirá com ampla compreensão
do tema que estamos tratando.
Se formos atrás da definição de “prospectiva”
no dicionário vamos encontrar no dicionário que ser refere a um substantivo
feminino que significa:
1. m.q. PERSPECTIVA ('vista ao longe').
2. Conjunto de pesquisas a respeito de fenômenos
técnicos, tecnológicos, científicos, econômicos, sociais etc., que procura
prever a evolução futura das sociedades.
Logo “prospecção” ou “prospectar”
também não guardam relação com prospectiva – termo comumente utilizado como
sinônimos –, visto que “prospecção” no dicionário se refere a um substantivo
feminino que significa:
1. Ato ou efeito de prospectar.
2. Conjunto de técnicas relativas à pesquisa,
localização precisa e estudo preliminar de uma jazida mineral ou petrolífera. "fazer
p. de petróleo"
Já “prospectar” é um verbo que
significa:
1. Quando intransitivo – ser mais visível ou mais
importante; sobressair, salientar-se. "na cordilheira, o Aconcágua
prospectava ao longe, imponente".
2. Quando transitivo direto e intransitivo –procurar
(jazidas minerais ou petrolíferas) em um terreno. "p. petróleo".
Veja que a definição de “prospectiva”
difere do conceito apresentado por Gaston Berger (1959) considerado o “pai” da
prospectiva. Segundo Berger, prospectiva não se trata de um método ou uma
disciplina, mas de uma atitude. Ele argumenta que a palavra em si já remete
para o olhar a frente, direcionado para o futuro e que a pesquisa prospectiva
se dedica a estudar o futuro. Nesse contexto, Berger destaca as características
da atitude prospectiva: (1) ver longe; (2) ver grande; (3) analisar com
profundidade; (4) correr riscos; e (5) pensar no homem.
Já o foresight, segundo
consta no dicionário é um substantivo:
1. the ability to predict or the action of predicting what
will happen or be needed in the future. Ex.: "He had the foresight to
check that his escape route was clear". (a capacidade de prever ou a ação
de prever o que acontecerá ou será necessário no futuro. "ele teve a
precaução de olhar a frente se sua rota de fuga estava livre."
Vejam que a definição é muito
semelhante a de prospectiva, entretanto, não restringe o olhar para o longo
prazo.
Para Amsteus (2008), Horton (1999)
e Slaughter (1996), o foresight refere-se a uma atividade sistemática e
permanente de olhar para o futuro e compreender os sinais existentes no
ambiente que levem a ação antes que se tornem realidade. Esse processo de desenvolver
pontos de vista sobre as possíveis maneiras que o futuro poderá se desenvolver,
por meio da percepção cognitiva, contribui com a tomada de decisão e a ação de
forma a moldar o futuro, avaliando as ações em curso e levando a atuação
proativa.
Horton (1999) chega a descrever
esse processo como sendo formando por três fases: (1) Coleta, compilação e
resumo da informação disponível e dos resultados na produção de conhecimento a
respeito do futuro; (2) Tradução e interpretação deste conhecimento para
produzir uma compreensão das suas implicações para o futuro; e (3) Assimilação
e avaliação desta compreensão para produzir um compromisso com a ação em uma
determinada organização.
Se por um lado a prospectiva
refere-se a uma atitude e não a um método, conforme afirma Berger, o foresight
é descrito fazendo referência ao método. Destaca-se que essa descrição é bem
genérica, visto que é possível encontrar em diferentes tipos de documentos um toolkit
do foresight, onde diversos métodos e técnicas são apresentados. Na
Figura 1, estão listados alguns levantados.
Figura 1 – Toolkit
do foresight
Veja que os cenários aparecem como
uma ferramenta para descreve como o futuro poderá ser. Então, cenário não é sinônimo
nem de foresight nem de prospectiva. E quando usamos os termos
conjugados cenários prospectivos estamos falando de cenários de longo prazo.
Lembro que
cenários são histórias sobre o futuro, como afirma Schwartz (1991). Representam
sequências hipotéticas de eventos futuros plausíveis, possíveis, coerentes,
relevantes e críveis, que permitem passar da situação de origem para uma
situação futura, conforme descreve Godet (2000). Logo, não se pode chamar a
conjuntura atual de cenário, pois a conjuntura está associada a realidade hoje
e os cenários a histórias sobre o futuro. Muito menos pode-se prospectar
cenários.
O uso
indiscriminado dessas palavras, sem a preocupação com suas definições e
contexto geram ruido de comunicação e dificulta a consolidação dessa área e da
tamática.
Referências
Amsteus, M. (2008) "Managerial foresight: concept and
measurement", Foresight, v. 10 n. 1, p.53-66.
https://doi.org/10.1108/14636680810856026
Berger, Gaston.
L’attitude prospective, p. 87-92, 1959. In: Gaston Berger; Jacques de
Bourbon-Busset; Pierre Massé. De la prospective: Textes fondamentaux de la
prospective française 1955-1966. 2ème édition. P.
Godet, M. (2000). The art of scenarios and strategic
planning: tools and pitfalls. Technological
Forecasting and Social Change, 65(1) (September) 3–22.
https://doi.org/10.1016/S0040-1625(99)00120-1.
Horton, A. (1999)."A simple guide to successful
foresight". Foresight, v. 1, n. 1 p. 5-9. http://dx.doi.org/10.1108/14636689910802052
Schwartz, P. (1991). The
art of the long view. New York: Doubleday.
Slaughter (1996). Towards a best-practice framework for
strategic foresight: Building theory from case studies in multinational
companies.
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