sexta-feira, 17 de maio de 2024

Reflexão sobre um artigo da Future Foresight Science

 Tracing the progress of scenario research in business and management

Arbrie Jashari; Victor Tiberius; Marina Dabić (2021). Tracing the progress of scenario research in business and management. Futures Foresight Sci., p. 1-9. https://doi.org/10.1002/ffo2.109

Por Elaine Marcial

O artigo apresenta uma avaliação bibliométrica da produção científica em cenário nos negócios e na gestão. Apesar de ser uma avaliação restrita a uma só base de dados e com foco na relação existente entre cenários e administração, traz uma contribuição interessante para a reflexão das organizações e orientações para pesquisas futuras.

O trabalho de bibliometria realizado na base “Web of Science” identifica seis clusters por meio do uso de análise de cocitação com foco histórico, a saber: (1) Planejando o Futuro com Cenários, (2) Planejamento por Cenários em Gestão Estratégica, (3) Reforçando a Técnica de Cenários, (4) Integração de Planejamento de Cenários e MCDA, (5) Combinação de Diferentes Métodos, e (6) Tomada de decisão por meio de Programação Estocástica.

Um ponto interessante da análise desses clusters foi a identificação dos focos das pesquisas ao longo do tempo. Ficou evidenciado que nas décadas de 1980 e 1990 o foco das pesquisas era o uso dos cenários como apoio ao planejamento estratégico, apresentando a metodologia – uso de cenários na gestão estratégica. Já o início dos anos 2000 há uma ênfase na integração entre scenario planning e tomada de decisão. Entre 2000 e 2014 houve um foco em pesquisas mais gerais relacionadas à revisão da literatura associada ao processo de scenario planning, mostrando sua utilidade e como esse processo poderia ser melhorado. Especificamente no período de 2007 a 2013, há uma ênfase em método, em especial o Delphi, bem como um destaque para a conjugação de métodos no processo de construção de cenários.

Essas descobertas, se confirmadas por meio de uma análise bibliométrica mais ampla e seguida por uma revisão sistemática da literatura, poderão auxiliar na formação de uma base curricular para a formação de profissionais para a área.

Outro ponto que gostaria de destacar é a identificação do aumento da conjugação entre métodos no processo de construção de cenários, bem como o uso do que no artigo foi chamado de “cenários de impacto” destacando-se os baseados em “black swans” (Faulkner et al., 2017; Hammond, 2016; Taleb, 2007) e “wildcards” (Mendonça et al., 2004; Saritas & Smith, 2011). Outro destaque foi dado a atuação dos atores na construção do futuro (Wenzel et al., 2020, p. 1443).

Esses achados nos mostram a importância tanto de conhecemos métodos, quanto das ferramentas do foresight para que sejamos capazes de formatarmos arranjos metodológicos consistentes e customizados para a realidade de cada organização.

Além disso, a construção do que foi chamado de “cenários de impacto”, com o uso de wild cards e black swans, nos alerta quanto a necessidade de exercitarmos nossa imaginação e construirmos cenários disruptivos para que possamos estar mais preparados para esses futuros que serão cada vez mais disruptivos, bem como desenvolvermos a capacidade de agir proativamente.

No artigo, também foi dada uma grande ênfase para o avanço e possível intensificação das pesquisas voltadas para a conexão entre aspectos cognitivos e comportamentais do cenário. Fornecem um destaque ao avanço da estratégia comportamental[1], em especial para a área financeira, baseada na Teoria Comportamental da Administração.

O interesse e a pesquisa na área das ciências cognitivas e comportamentais cresce em todo o mundo, em especial os voltados para a área de tomadas de decisão. Vieses cognitivos impedem que as pessoas enxerguem claramente o mundo a sua volta, produzindo pontos cegos, o que nos impede também de enxergarmos, com clareza, o futuro. Avanços nessas áreas ajudarão os profissionais da área de scenario planning a melhorar a sua capacidade de imaginar possibilidades de futuro, bem como do uso de tais visões como subsídio para melhorar a tomada de decisão.

O artigo também destaca que, apesar do avanço da atividade, em função do crescimento da incerteza ambiental e do aumento do risco, muitas indústrias ainda não aplicam scenario planning ou o uso de cenários para a tomada de decisão. Tal conclusão é baseada nos poucos estudos de caso publicados. Entretanto, acreditam que isso poderá mudar no futuro com o aumento da incerteza ambiental.

Para mim, a falta de future literacy associada a “tirania do imediatismo” faz com que muitas organizações ainda não façam uso de cenários na formulação da estratégia e para auxiliar a tomada de decisão. Entretanto, concordo com os autores do artigo em foco quando afirmam que esse ambiente mude em função do aumento da incerteza ambiental e do fracasso das decisões tomadas com base nas informações do passado. Porém, future literacy certamente exercerá um papel importante nessa jornada.

Por fim, destaco a importância da realização de estudos dessa natureza para que haja uma compreensão da evolução da área, identificação de seus marcos teóricos e, assim, ser possível direcionar as pesquisas para o preenchimento de lacunas encontradas na revisão sistemática da literatura, bem como para a formação de uma grade curricular básica de formação dos profissionais da área.

Referências

Faulkner, P., Feduzi, A., & Runde, J. (2017). Unknowns, Black Swans and the risk/uncertainty distinction. Cambridge Journal of Economics, 41(5), 1279–1302

Hammond, P. J. (2016). Catastrophic risk, rare events, and Black Swans: Could there be a countably additive synthesis? The Economics of the Global Environment (pp. 17–38). Cham: Springer

Mendonça, S., e Cunha, M. P., Kaivo‐oja, J., & Ruff, F. (2004). Wild cards, weak signals and organisational improvisation. Futures, 36(2), 201–218.

Powell, T. C., Lovallo, D., & Fox, C. R. (2011). Behavioral strategy. Strategic Management Journal, 32(13), 1369–1386

Saritas, O., & Smith, J. E. (2011). The big picture–trends, drivers, wild cards, discontinuities and weak signals. Futures, 43(3), 292–312

Taleb, N. N. (2007). The black swan: The impact of the highly improbable (2). Random house.

Wenzel, M., Krämer, H., Koch, J., & Reckwitz, A. (2020). Future and organization studies: On the rediscovery of a problematic temporal category in organizations. Organization Studies, 41(10), 1441–1455.



[1] Estratégia comportamental “visa trazer suposições realistas sobre a cognição humana, as emoções e o comportamento social para a gestão estratégica das organizações e, assim, enriquecer a teoria estratégica, a pesquisa empírica e a realidade real” (Powell et al., 2011, p. 1371).

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